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Marco Temporal: não se combate uma injustiça com outra

Artigo publicado no jornal Zero Hora, em 2 de junho de 2023.

A aprovação do PL 490/2007 na Câmara dos Deputados – que ratifica o marco temporal das terras indígenas, previsto na Constituição de 1988 – representa um passo importante da justiça social, da segurança jurídica e, principalmente, do direito de propriedade. Foram anos de debate, muitas vezes prejudicado por interesses ideológicos, mas que está próximo de ser superado pelo bom senso.

A Constituição é clara: a demarcação só pode acontecer se for comprovado que os requerentes estavam lá até 5 de outubro de 1988, com prazo de até cinco anos para as terras em litígio. Ainda assim, legítimos proprietários, a maioria de pequenos produtores, convivem com o risco de perder suas terras, à mercê de critérios discricionários da FUNAI e da omissão dos governos.

Como aceitar o superdimensionamento, a extensão indiscriminada ou a sobreposição de áreas ocupadas há mais de um ou dois séculos com registro em cartório? Tudo gerado num processo de expropriação a partir de um laudo com vício de origem, muitas vezes fraudulento, onde nunca é permitida a participação da outra parte envolvida. Esses proprietários, que nada têm de criminosos, são considerados como invasores de suas casas, adquiridas com o suor do trabalho.

Mais de 14% do território nacional é coberto por áreas indígenas, para uma população de 0,4% e que vive, em grande parte, nos níveis da mais extrema pobreza. Respeito à comunidade indígena se faz com a promoção de dignidade. É ainda importante se dizer que a maioria das demarcações reivindicadas nunca foi de aspiração indígena, mas de grupos com interesses financeiros em explorar ilegalmente as matérias-primas locais, lucrando milhões de reais à custa dos índios.

Não se pode admitir que um país reconhecido mundialmente pela sua capacidade de produzir alimentos fique suscetível a conflitos institucionais desse tipo. Se precisar de terra para as comunidades indígenas, o governo pode comprar sem expropriar ninguém, pois não se combate uma injustiça com outra.

Alceu Moreira
Deputado Federal (MDB-RS)

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